domingo, 20 de fevereiro de 2011

Buona permanenza!


Hoje Alexandre viajou para fazer um curso na França e eu fiquei no barco, só. É uma situação sempre difícil, porque, embora seja bom ter um tempo egoisticamente organizado para si tão somente, a sensação de isolamento que estamos sentindo nos últimos tempos fica mais evidente nessas ocasiões. Pescara é uma cidade bonita, bem desenvolvida, com uma orla agradável e ruas cheias de pessoas indo e vindo. Mas aqui não conseguimos até agora estreitar nossos laços, fazer grandes amizades, estabelecer aquele canto preferido que sempre nos trará memórias. Posso passear, andar por aí, mas sempre falta alguma coisa, falta uma destinação, mesmo que seja ir até o café que faz sua cioccolata calda preferida. Bem diverso do que aconteceu na Sardenha, onde não nos sentíamos estrangeiros, mas sardos. Lia o jornal local todo dia, comentava as notícias, ia ao Kult jantar e encontrávamos sempre a divertida garçonete Cristina, visitávamos sempre Paola e sua família acolhedora, o que nos rendia sempre momentos felizes, ia a secretaria da marina para conversar com Maria, ríamos das histórias de Gianni e Marcello, íamos a praia, onde Alexandre fazia windsurf em um mar gelado e eu tirava fotos abrigada sob vários casacos ou dentro do carro.

Depois de deixar Alexandre no ônibus, voltava pensando nisso tudo, nostalgicamente mesclando memórias brasileiras e sardas, quando, chegando à porta do barco, encontrei um senhor de idade que o olhava encantado. Quando fiz menção de entrar, ele me perguntou se essa maravilha era minha. Disse que não, que trabalhava e morava nele com meu marido ao que ele disse que nos invejava, que era uma bela vida. Concordei, é de fato uma bela vida, e conversamos por alguns minutos. Ele estava na marina para tentar fotografar a regata de veleiros, que eu nem sabia que teria hoje. Perguntou da travessia, se eu sentia medo, quão grande era o barco, se já era carnaval no Brasil e orgulhosamente contou que havia fotografado o iate de Dolce e Gabanna em uma marina em Lavagna. Seu neto arquiteto morou no Brasil por anos, onde exerceu a profissão e, apesar de amar nosso país, voltou para trabalhar com o pai em seu escritório e também por sentir uma certa sensação de deslocamento. Ironia, será que lê pensamento?

Aí então, ao nos despedirmos, ele disse uma frase simples, que nem imagina o quanto significou para mim. “Arrivederci e buona permanenza”. Ah! É justamente isso que espero! Bons tempos, uma boa estadia aqui, até recomeçarmos nossas navegadas mar afora. Sendo assim, em homenagem a cidade que me abriga agora, publico uma foto tirada a partir do barco, que reflete um novo olhar que agora adoto, mais generoso e despretensioso. Quem sabe, o problema não é necessariamente o lugar, mas o apego que sempre temos às memórias queridas.

2 comentários:

Rosanne Woelz disse...

Gabi, jamais pude imaginar que escreves tão bem! Pude entrar em teu post com alma, e sentir tudo o que sentistes com esse velhinho na tua popa, lhe dando uma chacoalhada para a vida. Ela nos informa coisas atraves de mensagens, sinais, ou até mesmo com rasteiras, como minha doença, para ficar QUIETA!
Parabéns adorei teu blog. Vou colocar nos favoritos. bj

Chris disse...

Olá Gabriela
Vcs ainda estão em PEscara?
Conheci seu blog através do Mundo de Rosanne, Gostei muito dos seus relatos, depois descobri cque conhecia o Alexandre aqui do Bracuhy. Eu trabalho no verão num veleiro que a base é em Bari, passando por lá em junho nós procure na marina Ranieri, veleiro Fetch IV, todo a tripulação é de brasileiros. Bons ventos e aguardo uma visita.
Christina

www.veleiro.net/aquarela
http://memoriasviva.wordpress.com